sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

8 - Usinas da Baixada


“A Baixada é como a cana-de-açúcar: Sempre doce”.
(Escritor Jorge Renato Pereira Pinto).

Por muitas décadas, a economia da Baixada Campista era/é baseada na agroindústria açucareira. Das onze usinas de açúcar, oito ficavam na Baixada: Santo Antônio, Taí, Paraíso de Tocos, Poço Gordo, Sant’Ana, Cambaíba, São José e Baixa Grande. Dessas, apenas a São José resistiu à crise que o setor ultrapassou nas últimas décadas.
A cana-de-açúcar foi/é a grande responsável pelo progresso de toda região. O cultivo começou a partir do século XVII, inicialmente com resultado promissor na antiga e extinta Capitania de São Tomé do donatário Pero de Góis. Mas só depois de 100 anos é que a cana-de-açúcar começou a disputar espaço com a criação de gado. O engenheiro, professor e escritor Jorge Renato Pereira Pinto, em um depoimento colhido pelos pesquisadores, retrata bem esse importância.

“A cana-de-açúcar foi a grande mola propulsora do progresso. Quando começou a colonização, a primeira demonstração econômica foi a criação de gado, posteriormente, surgiu a cana-de-açúcar para produzir a água ardente e o açúcar. As atividades desenvolveram economicamente a Baixada atraindo cada vez mais pessoas para a região. Os núcleos de população eram próximos aos engenhos que mais tarde tornaram-se grande indústrias”.

O escritor Álano Barcelos (op.cit. p.9), lembra que o início do cultivo da cana se deu na Baixada Campista, apesar de registros dando conta de que os primeiros canaviais surgiram na Vila da Rainha, hoje Barra do Itabapoana, às margens do rio do mesmo nome:

“A partir de 1648 a pecuária continuou em expansão e surgiram os primeiros canaviais, cujo pioneirismo cabe à Baixada Campista, mais acabou se instalando em toda planície”.

Se no começo do século XVIII eram umas 50 engenhocas, nos meados do século XIX passavam de 700. O modelo foi ao longo de sua evolução se sofisticando, passando a ter prédio adequado para sua atividade, mais afastada da casa grande. José Veríssimo da Costa Pereira, em matéria publicada na “Revista Brasileira de Geografia”, no ano de 1947, resume esse potencial econômico:

“As condições ubérrimas do solo explicam, assim, a razão de tantas chaminés de usinas observadas sobre uma área proporcionalmente pequena e, também, um dos motivos fortes de todo poderio econômico atual de Campos e da sua própria evolução social. Esta, verdadeiramente, tem raízes profundas na história da lavoura canavieira e da indústria do açúcar, implantada pelos Assecas, - embora incipientemente - desde os começos do século XVII, na planície das aluviões recentes do Paraíba interior. Desenvolvida no século XIX, modernizada depois da Primeira Guerra, a industria renovou-se finalmente ao impulso centralizador da atividade fabril característica das grandes usinas atuais de açúcar e de álcool”.

De acordo com dados recolhidos na Biblioteca Nilo Peçanha, em Campos, foi na virada do século que aumentou o número de usinas, quando chegavam a 27. As maiores em produção eram Cupim, Poço Gordo, Santa Cruz, Tocos e Barcelos. Duas delas pertenciam à Baixada Campista: Poço Gordo e Tocos. Dados confirmados pelo escritor Jorge Renato Pereira Pinto, (“Um Pedaço de Terra Chamado Campos”, 1º edição 1987, p.5).

“Em Campos, ora Mineiros ora São José ou São João estabelecia a primazia de primeira produtora. Campos ultrapassava 1 milhão de sacos de açúcar. Mais de 400 Km de estradas de ferro próprias transportavam canas de fornecedores e das usinas. Vivia-se grande euforia nos negócios e na ampliação produtiva. A cidade era então o 2º produtor do Brasil, somente superado por Pernambuco, mas mantinha o 1º lugar brasileiro como município produtor”.

Em 1930 o Brasil vivia uma fase conturbada na política, o que refletia na situação econômica do país. Chegava ao fim a República Velha e a população esperava mudanças estruturais do governo. No livro “História do Brasil”, escrito por Francisco de Assis Silva, (Editora Moderna, 1994, p. 240), diz o seguinte:

“Em 1929, Washington Luís, então Presidente da República, precisava indicar um sucessor contrariando a política do café-com-leite, ao invés de indicar o mineiro Antônio Carlos, que há muito se preparava para ocupar o cargo, resolveu optar pelo paulista Júlio Prestes.
Diante do impasse, Antônio Carlos aproximou-se das oligarquias gaúchas, e, para fazer frente ao candidato paulista, articulou com elas a candidatura de Getúlio Vargas, então governador do Estado e ex-Ministro da fazenda de Washington Luís.
Com uma fraudulenta eleição, Júlio Prestes consegue ganhar Getúlio Vargas. Mas sob fogo de uma revolução oligárquica dissidente que teve os tenentes com seu braço amado, essa situação foi mudada e uma nova era surgiu no Brasil: a Era Vargas. A economia iria dar passos largos”.

A criação do Instituto do Açúcar e do Álcool consolidou a agroindústria do açúcar e incentivou a produção do álcool. Na cronologia da história brasileira essa criação, em 1931, foi o grande passo para as conquistas do setor. Em outro livro que também retrata a história do Brasil, escrito por Antônio Pedro e Lizânias de Lima, (Editora FTD, 1996, p.210), resume bem os rumos que a economia tomou desde então.

“O governo federal criou em 1931 o Conselho Nacional do Café, e para valorizar o produto comprou 17 milhões de sacas e obrigou os cafeicultores a diminuírem a produção. Entre 1931 e 44, foram retiradas do mercado e queimadas mais de 80 milhões de sacas de café. O governo provisório também criou o Instituto do Açúcar e do Álcool e o Instituto do Cacau com o mesmo objetivo de controlar a produção e os preços”.

Neste período Campos, ainda, era o maior produtor de açúcar do Brasil. Com as quotas de produção estabelecidas por um estatuto feito pelo governo, o lucro era maior e as usinas viveram um momento de ascensão. Jorge Renato (op,cit. p.7) relata bem esses tempos:

“Em 1945, a região de Campos ultrapassava 3 milhões de sacas de açúcar e a Usina São José (localizada em Goytacazes) era uma das quatro maiores usinas do Brasil. Campos produzia, sozinho, 91% da produção de todo estado do Rio de Janeiro”.

Mas a atividade canavieira, do Estado do Rio de Janeiro, centrada no município de Campos dos Goytacazes, e desenvolvida, também, nas regiões norte e noroeste do Estado, ocupou até a década de 30, o segundo lugar no país em termo de produção de açúcar. Começou a entrar em declínio, com a entrada no mercado produtor de Estados altamente desenvolvidos, agrícola e industrialmente, como São Paulo e Paraná. A modificação climática ocorrida na região, com intensas e constantes irregularidades, ocasionando quedas na produção de cana-de-açúcar, por fim, a extinção do Instituto do Açúcar e do Álcool, órgão estatal regulador da atividade, desencadeou um processo decrescente na produção de canas e de seus derivados.
A crise no setor não tardou a chegar, três décadas depois, assinalando o desmoronamento do parque açucareiro que, mesmo alterando o seu modelo, não conseguiu superar as crescentes dívidas em dólares, avalizadas pelo próprio governo
24. Jorge Renato Pereira Pinto ainda acrescenta:

“Aumentou-se o Parque Açucareiro a partir de 1973, alterando o modelo. Desaparecendo as usinas, mas a área plantada continua a mesma e até diminuiu. O Parque Industrial poderia produzir 25 milhões de sacos de açúcar e mais de 200 milhões de litros de álcool. Mas a matéria prima ficou a mesma e a ociosidade, a queima dos canaviais e os baixos rendimentos concorreram para uma crise sem precedentes”.

Atualmente o parque industrial de toda área regional está reduzido a nove usinas, sendo que quatro localizadas no município de Campos, são elas: Sapucaia, São José, Paraíso e Cupim. A meta é alcançar, nesta safra, os números de 1979, quando a produção chegou a 115 milhões de litros de álcool e cerca de 3 milhões de sacas de açúcar. Os produtores e usineiros, hoje empresários de outros Estados, porque os chamados coronéis do açúcar, todos conheceram a face negra da falência, esperam um novo ciclo e agora pretendem investir mais nos modelos de cooperativas
25.
A busca por dados históricos sobre as usinas que faziam parte da Baixada Campista é tarefa difícil. Os principais dados estavam nos arquivos da extinta COOPERFLU (Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Norte Fluminense), atualmente o prédio está sobre penhora e para acessar os arquivos apenas com a autorização judicial, o que dificulta o trabalho do pesquisador. Os dados que seguem foram apurados através da história oral dos antigos funcionários das usinas.
24 As causas do esterroamento econômico das usinas passam pelo período denominado de Milagre Brasileiro, durou mais ou menos de 1972 a 1975. A euforia do preço do açúcar na Bolsa de Nova Iorque criou uma falsa euforia e o Governo resolveu financiar a ampliação do parque industrial. Com o fim do milagre, as usinas ficaram endividadas e n ao tiveram condições para pagar as dívidas para com o Banco do Brasil.
25 Os argumentos usados pelo escritor (ex-usineiro) Jorge Renato Pereira Pinto passam muito pelo ponto de vista das classes dominantes. A realidade é outra: Os coronéis do açúcar faliram porque não acompanharam as novas tecnologias e se esqueceram de criar condições necessárias para que seus sucessores pudessem tocar este tipo de atividade. De um modo geral os usineiros botavam seus filhos para estudar medicina, odontologia, advocacia....

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