quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

13.1 - O Muxuango

Indesejável ao convívio social, este homem branco enfrentou diversos combates contra os navios corsários e contrabandistas franceses que tentavam a todo custo explorar a costa fluminense. O muxuango surgiu em nossa planície pelo caminho mais fácil, mas foi parar num deserto que o reteve e o dispersou, dificultando assim a sua progressão, seduzido pelo alimento farto, ele se deixa ficar na aridez e na monotonia do deserto das lagoas. Mesmo sendo pertinente à restinga, é a monotonia que o deprime e o condena, ele então involui e se transforma num retardatário envergonhado, e os seus resíduos étnicos começam então a se degenerar e definhar pelo isolamento da civilização.
É no aspecto físico que se consegue descobrir as suas características, com a pele branca, cabelos louros, de olhos azuis ou esverdeados, rosto largo, lábios finos, nariz reto, corpo magro e estatura variável.
Este homem de andar cansado, com o passo arrastado pelas botas no chão, traço característico de quem marcha sobre a areia e anda com dificuldade através dos atoladiços, é visto tanto de um lado como do outro do Rio Paraíba, sempre pela margem da costa fluminense.
É na palidez de seu rosto, que se vê as marcas das doenças que o afligem, como a verminose, o paludismo e a anquilostomíase. Tudo isso por causa da apatia e da escassez de vitaminas na alimentação, feita de paçoca, carne-seca e peixe-salgado.
A terra onde vive e trabalha é improdutiva, cercada de brejos, areia e vegetação magra, emaranhada e cheia de espinhos. Ele então deixa-se vencer, cansado, e seu espírito se desinteressa de tudo, desaparece então a ambição, apaga-se os seus ideais, morre a iniciativa e finda a combatividade inicial, anterior a sua chegada a planície.
Este homem que antes de aparecer era civilizado, começa então a retornar a sua condição de selvagem, pois a terra o subjugou, e a impassibilidade da topografia já agora reproduz nele a impassibilidade humana.
A facilidade em apossar-se de sítios, morre quando descobre que o solo não vale nada, a terra é pobre e barata, além disso, a dificuldade de transporte não o permite criar uma cultura alimentícia que lhe dê retorno financeiro, desse modo, o muxuango vive igual ao índio, caçando e pescando nas lagoas, cultivando apenas mandiocas e abóboras, e fabricando farinha, além de cestarias primitivas e cerâmica.
O muxuango exibe-se semanalmente na feira de Gargaú, onde então aproveita para fazer compras, vender e trocar os seus produtos, como a farinha, principal produto da feira. Ele aparece nesta feira com seu terno de riscado e camisa de algodão, chegam no trote duro das “pulitanas”, ou na mesa dos carros de boi arrastados horas a fio pelos areais.
Alguns possuem posses, e é nas chaminés das suas engenhocas que eles mostram a solidão de suas fazendolas. A casa do muxuango é bem parecida com a dos gaúchos dos pampas, a maioria é baixa e escondida, em largos descampados arenosos. É nos amplos horizontes que vemos pontilhadas aqui e ali, uma ou outra casa.
O melhor exemplo da característica muxuanga é o aspecto residencial como Lamego descreve na p. XV de sua obra “A Planície do Solar e da Senzala”:

“Quase sempre acaçapada, nos largos descampados arenosos, pontilha aqui e além os horizontes amplos. É um símbolo do homem que a plantou. Branca e humilde, desabrigada na penúria da gleba estéril, afronta as soalheiras, os vendavais e os aguaceiros com a indiferença fatalista da gente que agasalha e que se extingue num acabamento de raça”.

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